quarta-feira, 6 de agosto de 2008

A ESTÉTICA EXTEMPORÂNEA NO UNIVERSO DE TUNGA


Dilemas de interpretação do neo-criativo

A arte contemporânea nos convida aos questionamentos sobre os desenhos inescrutáveis de suas instalações onde objetos do cotidiano são retirados do lugar comum e legitimados como obra de arte em espaços como museus, galerias e exposições.

Tal ousadia é percebida com espanto causando sensações que vão do repudio a admiração, fato é, que ninguém passa impune à arte contemporânea. Quem pôde esquecer O vaso sanitário exposto como obra de arte por Marcel Duchamp no inicio do século XX?

Uma mosca em meio a girinos, um ponto preto numa tela em branco, fotos disformes e repartidas, vídeos do vazio ou de paisagens, essas e outras expressões da arte contemporânea causaram certo estranhamento cultural na época em que foram assim expostas pondo em discussão o próprio conceito de arte.

Seria arte o David de Michelangelo e a Mosca entre Girinos de Tunga não? O que é arte? Quem confere a obra o status de arte? Tais questionamentos geralmente levavam as pessoas a se perguntar o que verdadeiramente seria arte? E o que de fato aqueles objetos muitas vezes tão conhecidos e próximos do público queriam dizer além de sua prosaica função?

A arte contemporânea devorou muita gente com o seu sorvedouro, imbricado de hermetismo durante muito tempo. Fazendo nos sentir como gorilas diante de um monólito. Comportamento que na atualidade foi superado.

Hoje as obras de arte contemporânea já não assustam tanto. Antes, pelo contrário, ao visitar uma exposição em que as pessoas não encontram uma possibilidade de interação e diálogo mais direto com á obra, elas saem com a sensação de que algo lhes faltou. E, se antes, a obra de arte as intimidavam e afastavam por conter em si algo enigmático e ao mesmo tempo aberto e cheio de mistérios, na atualidade o público já se aproxima com a sensibilidade necessária para dialogar com essas possibilidades hermenêuticas e quer extrair o máximo da obra ali exposta. Pois entendem Ser e Estar ali, imbricado no objeto, uma semiótica oculta, carregada de polissemia, que só será entendida e desvelada se o (tele) espectador (a) o possuir como um áporo. Logo aquela sensação não bastada, cede lugar á uma experiência fantástica e impregnada de saber, é como estar bebendo de uma fonte de águas vivas.

È assim que as obras de Tunga, artista plástico, pernambucano que expôs esse mês aqui em Salvador se coloca diante do público. Cheia de ludicidade, encanto e maximalismo.

Com objetos extraídos da sua mais ordinária condição, ele faz saltar para a irreal extraordinária posição. Dando foco extemporâneo ás suas criações, marcando esteticamente suas formas, linhas, nuances cromáticas e densidades dosadas de luz e sombra.

O espaço preenchido por Tunga é muito bem aproveitado. Com seu jogo de luz e sombra, até o vazio ganha sentido, pleno de uma atmosfera etérea de transparência fosca e leve. Seus objetos em tamanhos irreais, não estão ali por uma questão de elementariedade espacial, mais, dialoga de forma explicita e recôndita com a condição humana. Pois na maioria das vezes a forma a ele configurada o remete a um problema comum ao ser humano desde sua condição primitiva enquanto ser dotado de capacidade social como, por exemplo, a problemática relação e discussão de gênero nas relações humanas.

O conceitual maximilista na simplicidade hermética de suas formas nos faz conceber, como sugere Agnaldo Farias em seu texto sobre a Arte Contemporânea Brasileira, que cada obra de arte traz embutida uma reflexão quanto á própria noção de arte que nós temos, e é essa mesma obra de arte que vem modificar a estrutura daquilo que conhecemos e classificamos como arte. Fato que no universo artístico e proposto por Tunga, se estabelece de maneira vital e transformadora de seu meio. Afastando assim consideravelmente o estranhamento cultural, associado comumente ao que nos é inédito.